Capicua
CAPICUA
Optimus
Discos 2012
Nota: 7.5 / 10
Este é um
daqueles exemplos que pode muito bem mudar a forma como se vê e se ouve o Hip
Hop em Portugal. Capicua é uma rapper digna do nome mas surge de um mundo muito
diferente daquele que nos habituámos a ver. As letras demonstram o passado
sorridente da artista, que teve uma vida muito mais fácil do que a de muitos
outros músicos da sua “praia”. O passado, aqui descrito, é constantemente
aliado à intenção, muito vincada, em demonstrar o que o seu som pode trazer à
cena Hip Hop portuguesa. Esta «Maria Capaz» retrata ao mesmo tempo uma “maria
rapaz”, que certamente, há 20 anos atrás, fora nas ruas do Porto. A exaltação
do seu bom trabalho e o desafio que lança a outros MC’s é outra marca
fundamental do single deste álbum-estreia.
De facto
este é um disco que apresenta muito bem a vida numa cidade. A mesma “estória”
em qualquer semana do mês, tão rotineira e cíclica como uma “Capicua”, que pode
ser lida em várias direcções, mas sempre da mesma forma como no «1º dia». Para
confirmar a tendência, os temas: «Hora Certa», onde o arranjo com trompetes
“aquece” um cenário sentimental, num fim de tarde; o sonho de uma «Casa do
Campo», como a de Elis Regina, com o perfume a “Pão quente, terra molhada e
manjerico”; e «Domingo», um dia que parece não servir de muito e que surge em
forma de um tema com que muitos se vão identificar.
Em defesa
do Hip Hop e do seu trabalho surge «A última», onde a rapper aponta que «já
devia haver um sindicato para MC» e que basta de preconceito sexual na área.
«Chamem rap ao rap de raparigas». Exalta Ana, naquele que é o último tema do
álbum. Mas deixo outras ressalvas que justificam a nota artística deste álbum,
entre elas, «Sagitário» e «Judas e Dalilas» onde Ana demonstra muito bem a sua veia
poética mais surrealista, aliando aspectos muito atuais com temáticas
mitológicas e bíblicas, talvez apoiada nos estudos académicos, que ostenta,
aliados às vivências urbanas que o álbum apresenta.
Relevante
ainda a consciência política das faixas «Os Heróis», que acalenta esperança
para todos os jovens e licenciados em geral que vivem o flagelo do desemprego;
e «Terapia de Grupo», onde Portugal surge como um “masoquista anónimo” pronto
para uma reabilitação que parece nunca mais chegar.
Crítico, moderno,
mas muito inspirado em sonoridades dos anos 90 que me fizeram recordar, entre
outros, os seus conterrâneos «Mind Da Gap». Notam-se ainda toques de Funk e
World Music, muito swing, groove nas guitarras-baixo, sopros, e apontamentos
muito interessantes de percussão. Uma receita que acrescentou ao álbum
variações algo incomuns no Hip Hop, associadas ao trabalho da rapper portuense
com Sam The Kid, Darksunn, Nelassassin e D-one “fabricantes”
de Beats bem estruturados e com “corpo”, posteriormente bem misturados por
Ghuna X.
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