Era dia de concerto dos The Black Keys e Maccabees
na outra ponta de cidade. Ele não estava no Pavilhão Atlântico, com
muita pena dele, e antes contava-nos a sua história, junto ao rio Tejo.
É o chamado ‘novo artista’. Emergiu dos meandros da internet e
redes sociais, mas também por culpa da sorte e outro tanto de talento.
Alex D’Alva Teixeira está longe de ser um nome artístico fabricado.
É um nome real de família (e não de uma família real), tem tanto
de imponente como ele e está cheio de punk.
“Há muito pouco tempo a minha mãe ouviu a minha música na rádio
e ficou toda contente. Quando cheguei a casa disse-me: ‘’Ah, que
pena, há tanto tempo que ‘tá fazendo música e só agora é que
‘tá fazendo sucesso.”, contava Alex, entre risos e num sotaque
brasileiro, para uma imitação perfeita do que a mãe lhe dissera há
uns dias. Sem ressentimentos, Alex percebe que os timings não estão
contra ele, bem pelo contrário. Em Fevereiro do ano passado conquistou
o segundo lugar na 17ª edição do Festival Termómetro, no Porto.
O festival, preparado para descobrir novas revelações musicais em
Portugal, foi o mote para o que lhe está a acontecer agora.
Foi considerado um dos Novos Talentos Fnac 2012, cuja compilação
tem o seu tema «Diz-me (Design)» e quatro meses depois a editora FlorCaveira
lançava o seu EP Não É Um Projecto. O nome do trabalho
tem um tira-teimas incorporado. Logo que começou a ficar conhecido
no meio cibernético-artístico, começou também a confusão. Uns diziam
que ele era o mentor de uma coisa, outros que ele era o protagonista
dessa mesma coisa. “No dia seguinte ao Termómetro, tínhamos vários
blogues a escrever sobre o festival. Na altura, éramos quatro pessoas
em cima de um palco e é o meu nome que aparece. O Alex não é um projecto,
é uma pessoa, um rapaz. O título do EP foi uma piada”, explica Alex.
Com a definição arrumada na negativa, Alex aparece com o single
de apresentação «3tempos». “Toda a gente diz que aquilo é Bloc
Party português”, adianta, desde logo, sobre aquilo que anda a mostrar. “Eu queria
imitá-los. Ouvi aquilo a primeira vez e nunca pensei que fosse possível
fazer rock e pôr as pessoas a dançar.”, confessa. Mas a banda britânica
não é a única influência de Alex. No seu blogue oficial, há posts
que denunciam alguém profundamente metamorfoseado por The Killers,
Radiohead, Gossip, Panic! At The Disco ou os Yeah Yeah Yeahs, e é o
próprio que confessa que, se não fossem bandas como estas, ele não
estaria a fazer o que faz hoje.
Só que houve quem achasse que eram influências a mais, como
Ben Monteiro, dos Triplet, e Vítor Hugo Azevedo, guitarrista dos Iconoclasts
e detentor da recente editora Corvo Records. São uma espécie de protectores
de Alex. Têm cerca de dez anos de diferença de idades em relação
ao miúdo Alex (de 22 anos) e ambos integraram bandas de quem ele era
fã. Vieram com o Alex para a nossa entrevista e acabaram por explicar
o que aquele tem de tão especial. Corria o ano de 2009 quando a primeira
banda do Alex, Cast a Fire (onde era baixista e formada depois do miúdo
ter visto a banda de Ben ao vivo em 2001) teve uma demo produzida pelo
próprio Ben. Aquela acabou por chegar ao fim e Ben considerava Alex
um “desperdício”. “Ele demonstra uma elasticidade fora do comum,
mas não é nenhum abençoado”, esclarece Ben. “E o que faço é
assumir o papel de produtor à antiga que encontra o talento e fazer
com que ele se descubra no meio de todas as influências”, completa.
O disco de estreia, produzido por Ben, é assim o resultado de
um filtro. Mas para Alex, tudo ainda parece muito turvo: “Cada vez que experimento qualquer coisa
nova, dou por mim a descobrir que antes pensava que nunca a iria fazer”.
“Não sei se sou merecedor de alguma coisa, mas quando paro para pensar
no que aconteceu este ano, chego à conclusão de que sou um miúdo
com muita sorte”, confessa Alex. A sorte chegou-lhe quando,
depois de organizar um festival, Ben e Vítor ofereceram-se para tocar
todas as músicas do seu EP. “Tive um bom karma”, conclui Alex.
alex d'alva teixeira/myspace |
“Um gajo que faz cenas fixes”
Mas apesar de se considerar versátil e multidisciplinado (palavras
dele), as expectativas que depositam nele causam-lhe alguns calafrios
e até tem medo de desiludir os amigos da banda ou o público que o
ouve. “Não é das piores coisas que existem na vida, mas para mim
não é muito fixe. Não lido muito bem com isso”, explica Alex. Ainda
que possa sentir vergonha de mostrar matéria nova ao seu produtor,
pior é quando se lembra do que fazia antes. “Sempre que começo a sentir-me confiante
e a achar que sou o maior, vou ouvir as minhas primeiras canções.
São de fugir”, conta descontraído.
E hoje, a internet e as redes sociais facilitam a visibilidade que
antes estava guardada nas tais cassetes. “Não sei se elas [as plataformas
digitais] são essenciais, mas têm um papel importante. Nos anos 90,
quando queria ouvir música nova, tinha de estar muito atento à rádio
e à televisão. Agora a internet dá-me uma escolha muito mais abrangente”
analisa Alex. “Como músico, é muito mais fácil fazer chegar o meu
trabalho a outras pessoas”, acrescentam contando que quando colocou
online uma mixtape apenas pensou que esta chegasse a meia dúzia de
pessoas.
Mas a confiança (ou a timidez disfarçada) de Alex não é uma coisa
nova. Tudo começou no infantário. “Num Natal, ofereceram-me um gravador
de cassetes e eu inventava coisas. Era uma criança muito irritante.
Não sei como os meus pais tinham paciência”, comenta Alex
com um ar perplexo. Foi ainda miúdo de igreja, mas nunca experimentou
canto lírico. O estilo que gosta menos é a kizomba, mas não descarta
nada: “Quando era mais novo não gostava nada de hip-hop e esta semana
só ouvi isso. Quem sabe um dia até possa ser o maior fã de kizomba
e faço um disco só disso”.
Entre Michael Jackson e Prince, o primeiro é o artista de eleição, sem grandes dúvidas, mas quem dera a Alex conseguir fazer os
falsetes do músico e dançarino de Minneapolis. As Spice Girls são
das melhores coisinhas pop que já consumiu e gosta de Design. É quase
como se tivesse dois amores e não soubesse de qual gosta mais, ou então
sabe, não fosse ele o típico puto que “pegava um objecto qualquer
que se parecesse com um microfone e dizia à mãe que queria ser cantor”.
Ainda assim, Alex tem uma impaciência saudável: “A minha vida
seria incompleta se só pudesse fazer uma coisa”. Quer antes ser como
um Salvador Dalí, porque aquele “fazia tanta coisa diferente”.
Por isso, quando lhe perguntamos se gostava de experimentar outras áreas,
responde sem hesitações: “Se tivesse possibilidade, investia em
audiovisuais” e “à frente das câmaras”. É uma resposta óbvia
para quem já viu Alex dançar ou para quem repara que cuida da imagem
ao milímetro. De piercing pendente no nariz, óculos de massa e um
cabelo afro metricamente cortado, desmancha-se às gargalhadas quando
nos conta isto: “Gosto imenso do look dos Metronomy e queria ser o
baixista deles”. E o desejo tornou-se realidade por alguns minutos.
No último festival Optimus Alive, em Algés, algumas pessoas, e em
especial os ingleses, confundiram-no com aquele músico da banda.
Quanto ao laço catita que enverga no pescoço, a explicação é
ainda mais simples e com mais gargalhadas: “Comecei a ver demasiados
blogues de moda durante este ano”. A arte é quase o seu nome do meio
(mais outro para alongar o original). Daqui a uns anos quer ser visto
como um artista e não só como músico ou como um designer. Ou melhor, “o
objectivo é ser criativo e ser um gajo que faz cenas ou um gajo que
faz cenas fixes” (mais gargalhadas).
Vitor diz que o Alex é um “escritor de canções belíssimas”
e Ben tem a sensação de que a história do Alex foi retirado da Sétima
Arte. Daquele “onde há aquele underdog (oprimido), aquele tipo que tem o talento, mas que
não tem possibilidades e, no fim, consegue triunfar”. Se este pode
ser o ‘Alex D’Alva Teixeira: O filme’? Alex responde:
“Hoje em dia teria de ser contado em forma de web série de baixo
orçamento”.
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