A Primeira Vez


A primeira vez que ouvi um álbum como deve ser ouvido - abrir a caixa, tirar gentilmente o CD, enfiá-lo na aparelhagem, carregar play e ouvir... tinha uns doze anos. Foi aos doze que descobri muita coisa, foi aos doze que comecei a ouvir Nirvana - Mtv Unplugged, foi aos doze que descobri um Black Album numa caixa de plástico azul no sótão de um tio que já não vejo há demasiado tempo. Mas foi aos doze que viajei até casa do meu primo, em Santo André, perto de Sines e avancei até ao quarto que ele partilhava com o irmão, sem saber o que ia acontecer depois.

Lembro-me de estar cansado, com um sono leve e lembro-me que só me apetecia deitar.
Enquanto estava a andar pelo corredor pensei em procurar um CD do meu primo mais velho, na altura quase a completar duas décadas de vida e ouvi-lo enquanto descansava na cama.
Fui até ao sítio onde ele tinha umas caixas amontoadas, vasculhei os álbuns que para ali andavam, passei por Deftones, Offspring, System of a Down, coisas que ele já me tinha mostrado, mas depois vi uns quantos CD's da mesma banda, vi uns quantos CD's de Red Hot Chilli Peppers.
Que nome esquisito para dar um grupo de gente que toca música, mas estavam ali tantos que pensei que ele só podia adorar aquilo.

Escolhi o Californication como podia ter escolhido Blood Sugar Sex Magik, Mothers Milk ou Freaky Styley, mas a capa do Californication era a mais gira para um miúdo, a piscina tinha água vermelha como se fosse um céu das sete da tarde, o céu era a água da piscina. Havia naquela capa alguma coisa que me confortou. Era calma.
Abri a capa e tirei o CD sem riscá-lo, perdi uns segundos a ligar a aparelhagem e depois carreguei no play.

A primeira música era barulho a mais e rapidez a mais para o meu estado cansado e passei à frente. Não permiti a mim mesmo descobrir que «Around the World» é uma música que viria a adorar mais tarde.

Quando começou «Parallel Universe» encostei-me na cama e fechei os olhos. Não dormi, estava de olhos fechados e não estava a pensar em nada, estava só a ouvir.
As músicas foram rodando, o álbum foi continuando. Tive sorte. Durante aquela hora o mundo pareceu esquecer que eu existia, que ali no fundo do corredor havia um quarto com uma aparelhagem e um álbum chamado Californication.
«Scar Tissue», «Otherside», «Get on Top» passei à frente pela mesma razão que a «Around the World», «Californication»...

Acho que nunca conseguir descansar outra vez com aquela paz de há dez anos, e há uns dias perguntaram:
“Se tivessem de escolher um álbum, qual seria?”
Devia ter respondido Californication.


 

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